segunda-feira, 13 de setembro de 2010

Pequeno jardim para olhar

Maria Medeiros compôs um "jardim para olhar", formado por pinturas cheias de aspectos sugestivos, que permitem ao espectador, mediante associações mentais, evocar seu próprio jardim de cores e vivências.

Esta série fica exposta no Espaço Arte Chico Madrid até 5 de outubro. Nesta sala, havíamos visto outros dois quadros da mesma artista, na mostra "Isla Negra" (à esq. na 1ª foto; veja nota), que em 2009 visitou a casa de Pablo Neruda naquele balneário chileno.

Maria joga com formas minuciosas, como os arabescos do barroco, e as expande a grandes tamanhos, parecido a como nós mesmos ampliamos detalhes pequenos do dia-a-dia para examiná-los e compreendê-los (em certas ocasiões da vida eles nos asfixiam e nos sentimos "afogando-nos num copo d'água").

Em tempos primitivos, nossa percepção infantil não distingue bem as formas visuais e é como se nossos sentimentos parecessem manchas coloridas, algumas de calidez, outras depressivas, e muitas tão misturadas que não sabemos se são boas ou más, se com elas rir ou chorar.

Diz a artista que sua pintura evoca a cultura em dois sentidos: "seja pela ornamentação que remete ao barroco, seja pelo colorido intenso que lembra o carnaval". Ainda em suas palavras, o gestual caligráfico é o que demarca a situação visual, "convivendo livremente reforçado pelas cores vibrantes e quentes".

O título da mostra já denota um conteúdo intencional. Mas não o faz diretamente e sim por aproximação à sensibilidade visual concreta do espectador, com sutileza mas não com a ingenuidade de um principante. As flores estão por toda parte, mas não cansam; antes, dão curiosidade.

É provável que essa sedução visual tenha pelo menos duas vias - a emocional e a racional - mas não sabemos se elas são paralelas ou se entrelaçam. Elaborações como ornamentos, recortes e superposições não dão mensagens específicas, mas geram sensações e pensamentos da zona pré-consciente e até outras mais profundas, como aqueles símbolos que jazem num misterioso ventre materno.

É assim como umas simples flores entram pelos olhos e chegam à mente menos consciente pela via das abstrações, não negando as aparências banais mas conseguindo dribá-las, como o faz a arte moderna.

Graças à manipulação fotográfica, o detalhe superior de um destes quadros pode ser apreciado nas cores originais ou sem elas (clique para ampliar). A alteração não foi pensada pela artista, mas o olho mental pode reconstruir, rever, comparar, ressignificar e finalmente voltar ao original, para revalorizá-lo.

No espaço habitualmente silencioso da Sociedade Sigmund Freud, estas pinturas suscitam um momento de reflexão, e seriam muito adequadas para uma sala de espera médica ou psicanalítica (ainda que neste local não se realizem atendimentos).
Imagens: F. A. Vidal

3 comentários:

Dóris disse...

Precisamos mais de pequenos e grandes jardins para olhar.

Silvia disse...

Falaram em jardins? Tive que vir olhar!
Parabéns pela postagem!

E se quiserem conhecer um pouquinho do meu....
Sejam bem-vindos!

http://tuledesilvia.blogspot.com

Francisco Antônio Vidal disse...

Aconselho o blogue de Sílvia, "Tule", uma coleção de frases e fotos poéticas, tomadas em Pelotas.