sábado, 24 de outubro de 2009

Performance tentou mexer com Pelotas

No período de 20 de agosto a 18 de setembro, as salas de exposições do Centro Cultural Adail Bento Costa mostraram a série "De+talhe de Pelotas", de alunos formandos do Instituto de Artes e Design da UFPel.

Nada menos que 14 artistas exibiram algum detalhe de Pelotas por eles analisado. Não podendo destacar todos, só mencionarei um e fico à espera do momento de apresentar os demais, em notas à parte.

Sendo esta a quarta coletiva com o subtítulo "Arte = Profissão??", a amostra fez uma reflexão ampla sobre a atividade artística, sugerindo perguntas sobre o ser criativo e o ser profissional. Nesta ocasião, vemos que os artistas estão mais focados na mensagem que têm a dizer, a partir da arte; não nas consequências de manifestar-se, o que poderia relacionar-se com a profissão. Enfim, a reflexão ficou aberta.

O trabalho foi feito na disciplina de Prática Profissional, da profª Adriane Hernandez. A tarefa dos alunos era tomar uma fotografia de um detalhe da cidade e a partir dela criar uma obra artística com qualquer técnica, inclusive a fotografia.

Letícia Prado tomou como "detalhe de Pelotas" as prostitutas da Praça Osório e elaborou uma performance (atuação interativa, num cenário da realidade) com o título de "Turismo Sexual".

Em meio a prédios tombados e um fluxo intenso de pessoas, algumas mulheres têm neste lugar o seu negócio, onde a mercadoria é seu próprio corpo. As prostitutas estão todos os dias neste "ponto" turístico da cidade e convivem em harmonia com este contexto.

A artista armou um painel (1ª foto), semelhante a outros que se usam em pontos turísticos para levar uma lembrança da cultura local, mas este é a imagem de uma prostituta, onde o turista colocará o rosto assumindo simbolicamente - como costuma ser nos painéis deste tipo - o papel dela, de ganhar dinheiro em troca de sexo.

Na exposição, dentro da Casa Adail Bento Costa, Letícia colocou uma explicação da performance, e dois dias por semana expôs o painel na Praça, como se fosse qualquer fotógrafa de turistas. Os passantes que aceitassem participar eram fotografados e essas imagens iam, no dia seguinte, à exposição, inseridas num arquivador (3ª foto, clique para aumentar).

Cada dia algumas pessoas foram fotografadas, cerca de uma dúzia por semana, entre as quais homens e mulheres de diversas idades - todos, por certo, com muito bom humor. Numa das fotos aparecia um casal de namorados, com o rapaz colocando a cabeça no painel e a moça a um lado, tomando-lhe a mão.

O projeto parece aceitar a prostituição como atividade, ao encará-la com leveza e sem pudor, mas pode também entender-se como um questionamento a esta superposição espacial (e conceitual) entre visitação turística do "corpo" da cidade e visitação do corpo humano erotizado. Os pelotenses poderiam estar sugerindo (ou tolerando), sem querer, que o turista tradicional também use o "turismo sexual", algo que realmente existe no chamado Primeiro Mundo. Denunciar tal confusão é um dos focos do trabalho.

Letícia estipulava o que fazer se nenhum transeunte participasse: Se a cidade de Pelotas não tem um desses painéis porque não tem algo [alguém] que sirva de personagem, então eu escolho a prostituta que está em meio ao patrimônio histórico para que cumpra este papel.

Na quarta 9 de setembro, o desempenho da artista na Praça coincidiu com uma entrevista da banda porto-alegrense Bidê ou Balde, que tinha vindo a Pelotas para um show (veja a nota). Após falar para a repórter, o vocalista Carlinhos assumiu o papel de entrevistador e fez Letícia apresentar sua proposta (2ª foto), que a meu ver é de conteúdo socioantropológico e psicológico, e de formato artístico.
Fotos de F. A. Vidal

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